30 de mai. de 2013

Como pensa um sujeito típico da classe média

Como pensa um sujeito típico da classe média

Publicado por Sóstenes Lima
no sitio http://www.pavablog.com/
1. Considera-se um entendido de tudo[1] porque fez uma faculdade qualquer[2] e porque fala inglês;

2. Julga ser uma pessoa cosmopolita porque viaja com certa frequência para o exterior[3];

3. Fala de boca cheia que os Estados Unidos são o país mais civilizado do mundo;

4. Vive dizendo que gostaria de morar num país como os EUA ou outros países da Europa, em especial França, Alemanha e Inglaterra;

5. Acredita piamente que tudo que é de fora do Brasil[4] é necessariamente melhor do que as coisas daqui;

6.  Adora falar mal do Brasil, bancando o vira-lata, e acha que está arrasando;

7.  Acredita que corrupção e jeitinho são vícios exclusivamente brasileiros;

8. Tem ódio mortal do governo da Venezuela, Argentina e Cuba porque lê constantemente na Veja, Folha de S. Paulo e O Globo que esses países estão sendo governados por um socialismo totalitário;

9. Adora a revista Veja; na verdade, considera essa revistinha como uma bíblia, em matéria de jornalismo;

10. Considera Arnaldo Jabor um grande intelectual, talvez o homem mais inteligente da televisão brasileira;

11. Considera Rui Barbosa o maior intelectual que o Brasil já teve, embora ignore completamente o fato de que Rui Barbosa jamais escreveu alguma obra de grande relevância acadêmica;

12. Adora falar que o Brasil tem de seguir o exemplo da Coreia do Sul[5], que conseguiu realizar uma revolução incrível em seu sistema educacional nos últimos 30 anos, embora não faça ideia de como isso aconteceu;

13. Diz que o programa do governo bolsa família serve só para estimular a pobreza, a procriação e a preguiça;

14. Diz que o sistema de cotas é uma injustiça contra quem estuda, e algo que vai acabar deteriorando a qualidade das universidades públicas;

15. Leu um ou dois clássicos da literatura brasileira e, em razão disso, se julga um crítico literário erudito, capaz de sentenciar, a partir de uma análise refinada, que Paulo Coelho produz qualquer outra coisa, menos literatura;

16. Diz que o Brasil é definitivamente um país de terceiro mundo, um caso perdido, e ficou mais perdido depois do governo Lula;

17. Odeia o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva como se odeia o diabo;

18. Aguarda com ansiedade e delírio o dia em que o Supremo Tribunal Federal (STF), sob a liderança do estupendo, magnífico, santo, divino ministro Joaquim Barbosa[6] conseguirá colocar Lula na cadeia;

19. Tem um preconceito perverso, embora não admitido, contra pobre, negro e nordestino;

20. Lamenta que o Brasil tenha sido colonizado pelos portugueses e não pelos ingleses, pelos holandeses, pelos franceses ou pelos escambau;

21.  Diz que um dos grandes erros que o Brasil cometeu, em termos de infraestrutura, foi ter optado pelo sistema rodoviário em vez do ferroviário, embora não faça ideia de quem (ou qual classe social) foi responsável por essa decisão histórica;

22. É excessivamente moralista, em especial no que diz respeito a questões relacionadas à sexualidade;

23. Etc.

24. Etc.

25. Etc.

Para mim, o sujeito brevemente descrito acima constitui uma figura emblemática de nossa classe média pseudoerudita, pseudoescolarizada, pseudopolitizada, pseudoetc. Embora pudesse ter dito de outro modo, concordo plenamente com o que uma pessoa disse no twitter: “Nossa classe média não passa de uma elite de bosta”. Numa palestra recente, Marilena Chauí encerrou sua fala com uma descrição exuberante: “a classe média é uma abominação política, porque é fascista, é uma abominação ética porque é violenta, e é uma abominação cognitiva porque é ignorante”. E é para (in)formar essa elitizinha que a grande mídia fala, escreve, vomita.
Se você conhece muita gente com as características que apresentei acima, significa que Globo, Veja, Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo, O Globo, entre outras espeluncas jornalísticas, estão trabalhando bem.

[1] Esse sujeito se acha uma espécie de erudito anônimo que ainda não foi descoberto pela grande mídia e pelo mercado editorial pseudoerudito.
[2] A coisa piora muito quando o sujeito fez um curso que garante ao alienado a ilusão de que é doutor.
[3] Os EUA são o destino principal de viagem desse sujeito, onde ele se empanturra de compras.
[4] Entenda-se por fora do Brasil as seguintes localidades: EUA, Canadá, Europa, Austrália e Japão.
[5] Ele adora falar sobre isso porque já leu uma matéria magnífica, inesquecível na revista Veja sobre o assunto. 
[6] É preciso informar que a canonização de Joaquim Barbosa é a primeira realizada por Veja depois da canonização de FHC no início dos anos 2000.

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